Edição 9 - Port - Amazônia - Brazil

Para entender a obra de Simone Momente sobre o Teatro Amazonas, é

preciso primeiro compreender que a artista não retrata lugares; ela

costura memórias. Em sua jornada criativa, ícones da arquitetura como o

Copan e a Torre Eiffel se tornaram pretextos para explorar a passagem

do tempo e o afeto. Mas com a Amazônia, o chamado foi diferente. Era o

eco de um sonho antigo, nutrido por um fascínio pela natureza que lhe foi

transmitido ainda na infância. Era seu pai, recitando Gonçalves Dias –

"Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá" – que plantou a

semente de uma conexão que, agora, floresce em arte.

Esta obra, portanto, nasce de uma confluência entre a memória pessoal

e o imaginário coletivo. Na visão de Simone, o Teatro Amazonas

transcende a arquitetura para se tornar uma personagem com “voz

própria, presença e olhar”. Não é um edifício que ela pinta, mas uma

entidade que ela interpreta. Através de sua linguagem de colagens, que

sobrepõe camadas de papel e aquarela, ela nos apresenta um guardião

que se emociona, ri e zela pela interação dos povos. O palco se converte

em um portal, e a opulência europeia do edifício é abraçada, quase

rendida, pela força ancestral que o rodeia.

Na composição, o teatro é envolvido por ondas e folhas, como se a

própria floresta o reivindicasse para si, desenhando um novo pacto entre

cultura e território. A paleta não é decorativa: ela narra mitos. Os tons de

vermelho e verde invocam o Curupira, a forma da Vitória-Régia evoca a

lenda de Naiá, e as cores úmidas pulsam com a vida do rio que

atravessa corpos e tempos. Simone não ilustra; ela convoca fragmentos

de histórias ancestrais que resistem ao esquecimento.

O silêncio em sua obra não é ausência, mas densidade. É o som do que

só se percebe no recolhimento, um eco das próprias raízes. Nesse

processo criativo, a artista confessa ter sido atravessada pela energia da

floresta como quem sente um rio percorrer o corpo — em ondas, em

curva, em fluxo. Sua arte, profundamente intuitiva, nos convida a sentir

com o mesmo respeito com que se pisa a mata.