Nem toda floresta grita. Algumas sussurram — em frequências que só a arte pode captar.
É assim que Marcelo Ramos escuta a Amazônia: não com os ouvidos, mas com o corpo
inteiro. A floresta, em sua obra, não é paisagem nem conceito — é um organismo vivo, em
expansão. Um lugar onde os anéis de uma árvore dialogam com as mandalas da
existência, e a raiz da criação se ancora no invisível.
Sua arte não nasce de mapas, mas de atmosferas. Não retrata a Amazônia: a incorpora,
como um movimento interno que se manifesta em círculos, texturas, ritmos e silêncios. A
paleta é densa — tons terrosos que brotam das profundezas, pigmentos férreos como
açaí, cascas e flores selvagens. Mas também há o verde, e não apenas o que se vê nas
copas. É o verde ancestral que respira, comunica e vibra, como parte de uma fitosfera
consciente, viva, ativa.
Marcelo pinta com o que não se vê. Com aquilo que se sente entre o céu e a terra, entre a
meditação e o tronco, entre a pulsação da árvore e a pausa do espírito. Sua formação em
arquitetura não o prende à estrutura, mas lhe oferece equilíbrio. Suas experiências com
práticas energéticas como o qi-kung e o tai chi chuan fazem com que cada obra seja
também um campo vibracional, onde cores se distribuem como fluxos de energia sutil.
Na floresta — real ou interior — o silêncio é eloquente. É aquele silêncio noturno, denso e
repleto de sentidos, que ele já conhecia do tempo em que morou sozinho no cerrado de
Brasília. Ali, como na Amazônia, ele entendeu: não se abandona a civilização, mas se
reconecta com o essencial. É essa reconexão que pulsa em cada pincelada.
E quando o som da mata se transforma em imagem, surge uma sinfonia visual — um coro
de cores circulares, mais escuras, como se cada composição fosse uma partitura para os
olhos. Suas obras não ilustram. Elas vibram. Carregam consigo o movimento das raízes, a
fluidez dos rios e o peso da responsabilidade de traduzir um ecossistema inteiro em
sensações visuais.
Marcelo sabe que a floresta é mais que “o pulmão do mundo”. Ela é coração, cabeça,
braços, pernas, resistência. É a mão fechada do povo originário, erguida contra a
insensatez. A Amazônia, em sua visão, não é contemplação — é chamado. A arte, nesse
contexto, é um meio de expressar o que não pode mais ser ignorado: a ameaça constante
a uma fonte vital de vida, cultura e sabedoria.
Ao fim, contemplar a Amazônia pelos olhos de Marcelo Ramos é ser conduzido a uma
dimensão onde tudo está conectado. A arte torna-se floresta. A floresta, templo. E o
espectador, parte integrante do equilíbrio delicado entre a beleza e a urgência.