Pintar o que se sente já é uma tarefa para poucos. Mas escutar o que uma
floresta sente é um ato de rara comunhão. É nesse território que a arte de Vera
Triches agora habita. Após mais de quatro décadas de uma aclamada jornada
artística, ela se volta para a Amazônia não como tema, mas como interlocutora.
A floresta, para ela, não é paisagem; é entidade. Uma presença que lhe fala
através de um "silêncio ancestral", de "sons de pássaros" e de cores que são, em
si, "um sopro de vida". Natural de Francisco Beltrão, no Paraná, e radicada há
quatro décadas em Jaraguá do Sul em Santa Catarina, Brasil, sua obra, antes
marcada pela sobriedade do Sul, agora se deixa contaminar por uma nova e
visceral vibração, vinda da alma da floresta tropical.
É fascinante observar como sua estética tão particular, marcada por um neo-
expressionismo de elegância formal e um estilema "modiglianesco" nos
pescoços alongados de suas mulheres, se transforma ao encontrar a alma da
mata. O pescoço, antes um artifício de elegância, agora parece se esticar para
ouvir os segredos da floresta, conectando a cabeça (a sabedoria) à terra (as
raízes). A figura feminina, sempre central em sua obra, deixa de ser um ideal de
beleza para encarnar a própria força da natureza. Nas palavras da artista, ela se
torna uma "deusa de raízes fortes e selvagens", a "serena mulher dos rios e
raízes" que tem a capacidade de "criar, sustentar e resistir".
Essa imersão na ancestralidade da floresta é um reencontro. O "sopro de vida"
amazônico, guiado pela intuição, transforma-se em gestos espontâneos sobre a
tela. "As tintas viraram uma mulher quando deixei o coração comandar minha
mão", ela conta. Assim nasceu A Mulher da Floresta, como tantas outras que
vivem em suas obras: seres feitos de cor, de silêncio e de resistência.
Para Vera, a arte tem a responsabilidade de "provocar a consciência", e sua
visão da Amazônia é a de um "santuário sagrado que está constantemente
ameaçado". Suas telas não são apenas uma celebração da beleza, mas um
alerta sutil. Ela não pinta o fogo ou a devastação, mas o encanto que está "perto
de desaparecer". Sua obra se torna um escudo, uma forma de proteção que
nasce de dentro para fora, buscando fazer a floresta "pulsar no coração de
quem contempla".
No fim, a arte de Vera Triches sobre a Amazônia é um ato de profunda
comunhão. É a tradução de um lugar que grita em silêncio sob a sombra da
ameaça. É um convite para que o público sinta um misto de encantamento e
urgência, para que reconheça na mulher amazônica a beleza e a força de um
mundo que temos o dever de preservar.