Edição 9 - Port - Amazônia - Brazil

A história da arte está repleta de imagens que olham para os povos indígenas. A arte de

Bernardo David é sobre quando eles nos olham de volta. O rosto que estampa a capa da

ArtNow Report Internacional não é um objeto de contemplação etnográfica; é um sujeito que

nos interpela. A técnica hiper-realista, aqui, não serve à vaidade do virtuosismo, mas a um

propósito mais profundo e radical: tornar a presença daquela criança tão inegável, tão

visceralmente humana, que qualquer distância — geográfica, cultural, histórica — entra em

colapso. Esta é a essência do trabalho de Bernardo David: usar a precisão como ferramenta

para a dignidade, transformando a pintura em um ato de reconhecimento.

Essa maestria não nasceu nas academias, mas foi forjada no tempo lento de Tiradentes, a

cidade histórica mineira para onde se mudou na adolescência. Ali, em ateliês e na varanda

de casa, ele aprendeu a "observar tudo ao seu redor", desenvolvendo uma disciplina e uma

paciência que se tornariam a assinatura de sua obra. Sua técnica virtuosa não é o fim, mas o

veículo para uma busca mais profunda: a da essência por trás da aparência.

O hiper-realismo, em suas mãos, torna-se uma forma de reverência. Em um

mundo de imagens rápidas, descartáveis e que muitas vezes exotizam os povos

originários, dedicar horas para capturar a singularidade de um rosto é um ato

que é, ao mesmo tempo, poético e político. É um gesto de profundo respeito, que

devolve ao retratado o tempo e a atenção que lhe são historicamente negados.

Ao pintar os povos da Amazônia, Bernardo não está documentando uma etnia;

ele está usando sua maestria para imortalizar a força, a individualidade e a

humanidade de cada pessoa.