Edição 9 - Port - Amazônia - Brazil

A arte de Carina Melo opera a partir de uma inversão fundamental. Enquanto a pintura

tradicional busca congelar um instante de luz, sua obra constrói a arquitetura para que

a luz jamais pareça estática. Suas telas não são representações, são dispositivos

fenomenológicos: superfícies inteligentes, esculpidas com relevos e texturas, projetadas

para revelar a passagem do tempo. A luz não é o que ilumina a obra; é a matéria-prima

com a qual a obra se refaz a cada momento.

A gênese de seu trabalho é uma lúcida rejeição da imagem literal. “Numa era em que a

tecnologia é capaz de capturar paisagens com precisão”, afirma a artista, “não me

proponho a pintar exatamente o que vejo. Gosto de expressar como me sinto”. Essa

declaração é a chave para decifrar sua metodologia. Ela não pinta a natureza, mas a

sua impressão sensorial: a memória tátil do vento, a geometria orgânica das marés, a

pulsação silenciosa da terra. Suas telas são a materialização do que resta quando a

imagem se apaga e apenas a sensação permanece.

Para isso, a textura é sua sintaxe. Com a pasta acrílica, ela transforma a superfície

bidimensional da tela em uma microtopografia, um relevo sutil que funciona como um

mapa para o olhar e para a luz. Cada sulco, cada elevação, é uma decisão calculada

para gerar um “jogo encantador de luzes e sombras”. A obra se torna um organismo

vivo, que respira com o ambiente, contraindo e expandindo suas nuances conforme o

sol percorre o céu. É uma arte em estado de fluxo perpétuo.

Seu minimalismo estético não é uma ausência, mas uma estratégia de amplificação. Ao

reduzir o vocabulário cromático e formal, Carina cria um silêncio visual que aguça os

sentidos. O olhar, livre da distração da cor, é forçado a perceber o que há de mais sutil: o

movimento da sombra sobre o relevo, a vibração da luz, a própria respiração do

espaço.

O propósito final, portanto, é a engenharia de uma atmosfera. Suas obras são

concebidas não para serem vistas, mas para serem habitadas pelo olhar, gerando uma

"sensação de leveza, paz e serenidade". Essa tranquilidade não emana de uma

representação idílica, mas da rara oportunidade de testemunhar a passagem do tempo

inscrita na matéria. A arte de Carina Melo oferece, assim, o antídoto à fugacidade da

imagem contemporânea: não o registro de um instante, mas a experiência do próprio

instante se desdobrando.

Entre texturas e sentimentos

a jornada de Carina Melo na

arte contemporânea

Instagram: @carinamelo.art